Sunday, December 22, 2013

É A VIDA - Expectativas da vida


Expectativas da Vida

Diálogo entre duas vizinhas:
- Bom dia, como tem passado?
- Ah, olhe, como Deus quer...

OPTIMISMO
Construir em vez de combater

Creio que uma das atitudes fundamentais do homem humano deve ser a de reconhecer em si, numa falta de compreensão ou numa falta de acção, a origem das deficiências que nota no ambiente em que vive; só começamos, na verdade, a melhorar quando deixamos de nos queixar dos outros para nos queixarmos de nós, quando nos resolvemos a fornecer nós mesmo ao mundo o que nos parece faltar-lhe; numa palavra, quando passamos de uma atitude de pessimista censura a uma atitude de criação optimista, optimista não quanto ao estado presente, mas quanto aos resultados futuros. O mesmo terá já dado um grande passo para impedir os ataques, quando aceitar que só puderam existir porque  a sua acção não foi o que deveria ter sido; quando se lembrar ainda de que toda a sua coragem se não deve empregar a combater, mas a construir.
Agostinho da Silva

Tuesday, December 10, 2013

É A VIDA - Espelhado na Vida


Espelhado na Vida

Espelho meu, espelho meu, há alguém mais belo do que eu?...

ESPELHO
Este grande mundo, que uns multiplicam ainda como espécies dentro de um género, é o espelho onde temos de nos olhar para conhecermos com a perspectiva correcta.
Montaigne

Thursday, December 5, 2013

É A VIDA - Despassarado da Vida


Despassarado da Vida

Lembro-me, em tempos, de ter lido uma notícia sobre pessoas distraídas, e de ter ficado com pena de não ser mais distraída...

PESSOAS DISTRAÍDAS PODEM TER CÉREBROS MAIS EFICAZES
Pessoas com maior memória operacional - que lhes permite ter na mente mais informação e manipulá-la - distraem-se mais facilmente, concluiu um novo estudo científico.
(…)
"É quase como se a sua atenção estivesse tão absorvida por outros pensamentos que não sobrasse espaço para se recordarem de que pretendiam estar a ler", explica Daniel Levinson.

Tuesday, December 3, 2013

É A VIDA - Emparelhado na Vida


Emparelhado na vida

Preso por ter cão e preso por não ter!

A POSSE DESTRÓI SEMPRE O AMOR
A paixão, o amor, são coisas que, quando existem, é difícil que existam. Quando você me diz: “Gosto muito de quintas”, eu posso perguntar-lhe de imediato: “Tem alguma?” E você responde-me: “Tenho uma!” Então eu desconfio de que isso não tem nada a ver com o amor... Simplesmente o lucro, é a comodidade, qualquer coisa do género... Se, por outro lado, você me diz: “ Não tenho nenhuma quinta, nem quero!”, então aí já eu penso: “ Este sabe o que é amar.” Como vê, são dois verbos distintos, o verbo “amar” e o verbo “ter”; a posse destrói sempre o amor.
Agostinho da Silva

Friday, November 29, 2013

É A VIDA - Ensolarado da Vida


Ensolarado da Vida

Ainda bem que Lisboa tem em média 220 dias de sol por ano.

EXALTAÇÃO
Venha!
Venha uma pura alegria
Que não tenha
Nem a senha
Nem o dia!

Abra-se a porta da vida
Sem se perguntar quem é!
E cada qual que decida
Se quer a alma aquecida
No lume da nova fé.

Venha!
Venha um sol que ninguém tenha
No seu coração gelado!
Venha
Um fogueira de lenha
De todo o tempo passado!
Miguel Torga

Sunday, November 24, 2013

É A VIDA - Esfomeado da Vida


Esfomeado da Vida

É de desconfiar de quem não gosta de feijoada. Tem tudo o que a vida tem de bom, com uma especificidade: é para se cozinhar para muitos e para se comer entre conversas. Depois é só uma questão de mais ou menos picante.

FEIJOADA COMPLETA

Mulher, você vai gostar:
Tô levando uns amigos pra conversar,
Eles vão com uma fome que nem me contem,
Eles vão com uma sede de anteontem
Saca a cerveja estúpidamente
Gelada para um batalhão,
E vamos botar água no feijão.

Mulher, não vá se afobar,
Não tem que pôr a mesa, nem dar lugar
Põe os pratos no chão, e o chão tá posto,
E prepare as linguiças pro tira-gosto
Uca, açucar, cambuca de gelo e limão,
E vamos botar água no feijão

Mulher, você vai fritar
Um montão de torresmo pra acompanhar
Arroz branco, farofa e a malagueta
A laranja-bahia ou da seleta,
Joga o paio, carne seca, toucinho no caldeirão,
E vamos botar água no feijão.

Mulher, depois de salgar
Faça um bom refogado que é pra engrossar
Aproveita a gordura da frigideira,
Pra melhor temperar a couve mineira,
Diz que ta dura, pendura a fatura no nosso irmão,
E vamos botar água no feijão.


Friday, November 22, 2013

ERA UMA VEZ - Engavetado na Vida


Engavetado na Vida

Sair do armário, abrir gavetas ou cercar de muros, eis muitas questões.

CONSELHO
Cerca de grandes muros quem te sonhas.
Depois, onde é visível o jardim
Através do portão de grade dada,
Põe quantas flores são as mais risonhas,
Para que te conheçam só assim.
Onde ninguém o vir não ponhas nada.
Faze canteiros como os que outros têm,
Onde os olhares possam entrever
O teu jardim com lho vais mostrar.
Mas onde és teu, e nunca o vê ninguém,
Deixa as flores que vêm do chão crescer
E deixa as ervas naturais medrar.

Faze de ti um duplo ser guardado;
E que ninguém, que veja e fite, possa
Saber mais que um jardim de quem tu és -
Um jardim ostensivo e reservado,
Por trás do qual a flor nativa roça
A erva tão pobre que nem tu a vês…
Fernando Pessoa

Tuesday, November 19, 2013

É A VIDA - Desabrigado na Vida


Desabrigado na Vida

Estamos normalmente abrigados ora pelos tectos das nossas casas, ora pelos tectos dos nossos trabalhos e pouco vivemos as ruas. Já para outros é o contrário.

INTERVALO DOLOROSO
Já me cansa a rua, mas não, não me cansa – tudo é rua na vida. Há a taberna defronte, que vejo se olho por cima do ombro direito; e há os caixotes defronte, que vejo se olho por cima do ombro esquerdo; e, no meio, que não verei se me não voltar de todo, o sapateiro enche de som regular o portão do escritório da Companhia Africana. Os outros andares são indeterminados. No terceiro andar há uma pensão, dizem que imoral, mas isso é como tudo na vida. (...)
Bernardo Soares

Monday, November 18, 2013

É A VIDA - Inocência da Vida


Inocência da Vida

O entusiasmo de uma criança de três anos por uma ida ao supermercado é surpreendente. O que para nós é uma cegada da rotina semanal, para ela é uma oportunidade para ir muito mais longe.

A Rua é das Crianças
Ninguém sabe andar na rua como as crianças. Para elas é sempre uma novidade, é uma constante festa transpor umbrais. Sair à rua é para elas muito mais do que sair à rua. Vão com o vento. Não vão a nenhum sítio determinado, não se defendem dos olhares das outras pessoas e nem sequer, em dias escuros, a tempestade se reduz, como para a gente crescida, a um obstáculo que se opõe ao guarda-chuva. Abrem-se à aragem. Não projectam sobre as pedras, sobre as árvores, sobre as outras pessoas que passam, cuidados que não têm. Vão com a mãe à loja, mas apesar disso vão sempre muito mais longe. E nem sequer sabem que são a alegria de quem as vê passar e desaparecer.
Ruy Belo

Friday, November 15, 2013

É A VIDA - Passado da vida


Passado da Vida

E depois há aqueles dias em que fomos atropelados por um camião bem carregadinho.

Sofrer não importa, só lhe poderá fazer bem: o que é essencial é que você nunca decline o sofrimento. Também não importa que proteste, que se abata, que desanime, que chore e lance clamores: mas renunciar, nunca. Quando nos piores momentos lhe aparecer o tentador e lhe mostrar, em face da sua solidão, a companhia que sempre têm os simples, quando lhe mostrar, em face das suas incertezas, a segurança dos outros, que nunca haja no seu coração nem um leve movimento de ceder: esteja aos seus quarenta dias no deserto e aprenda o que não vem no Evangelho: que esses quarenta dias significam, para quem vale, a vida inteira. Pense sempre: como posso eu recusar este dom magnífico do sofrimento? Acharam-me digno de o levar comigo e hei-de pô-lo de parte? Confiaram-me o tesouro do rei e hei-de abandoná-lo, atirá-lo às silvas do caminho? Haja o que houver, suporte; quando não puder ir de pé, vá de joelhos, depois arraste-se, mas avance sempre enquanto possa e nunca largue o tesouro.
Agostinho da Silva


Wednesday, November 13, 2013

É A VIDA - Vazio da Vida

Vazio da Vida

- Em que é que estás a pensar?
- Em nada.

A vida precisa do vazio:
a lagarta dorme num vazio chamado casulo até se transformar em borboleta.
A música precisa de um vazio chamado silêncio para ser ouvida.
Um poema precisa do vazio da folha de papel em branco para ser escrito.
E as pessoas, para serem belas e amadas, precisam ter um vazio dentro delas.
A maioria acha o contrário; pensa que o bom é ser cheio.
Essas são as pessoas que se acham cheias de verdades e sabedoria e falam sem parar.
São umas chatas quando não são autoritárias.
Bonitas são as pessoas que falam pouco e sabem escutar.
A essas pessoas é fácil amar.
Elas estão cheias de vazio.
E é no vazio da distância que vive a saudade...
Rubem Alves

Tuesday, November 12, 2013

É A VIDA - Deslocado na Vida



Deslocado na Vida


Há vidas assim. Um eterno deslocado na vida que onde quer que esteja causa estranheza mas que por ali estar causa surpresa - no bom sentido.
Bem a propósito:

Vou continuar a procurar o meu mundo, o meu lugar
Porque até aqui eu só
Estou bem
Aonde não estou
Porque eu só estou bem
Aonde eu não vou
Porque eu só estou bem
Aonde não estou
Porque eu só estou bem
Aonde eu não vou
Porque eu só estou bem
Aonde não estou
(...)
Estou Além, do António Variações


Thursday, August 29, 2013

ERA UMA VEZ... A Maria do Céu



Era uma vez a Maria do Céu. Se havia coisa que a Maria do Céu gostava de fazer era de trepar às árvores. Não havia tronco que fosse difícil de subir, não havia alturas que a fizessem hesitar para mais uma escalada arriscada. As árvores a que mais gostava de subir eram as que davam frutos, especialmente as cerejeiras. A Maria do Céu adorava cerejas! Desafiava o Jorge,  do quintal do lado, e lá iam os dois comer as apetitosas bolas vermelhas até não mais parar:
- A minha mãe diz que as conversas são como as cerejas!...
E ficavam horas a rir e a conversar até ao sol se pôr.
Mas houve um dia que a Maria do Céu não regressou. Não era a época das cerejas e o Jorge não sabia dela.
- Onde árvore anda aquela rapariga? Interrogou-se a mãe.
A Maria do Céu estava adormecida de cansaço na árvore mais alta do parque. Não conseguira descer...
- Eu avisei-te Maria do Céu! Àquela não!!!!
- Mas eu tinha de subir... Para o que é que me chamaram Maria do Céu?

Monday, January 28, 2013

ERA UMA VEZ... O Misterioso Sr. Tristão


Era uma vez um senhor muito sério e com cara de poucos amigos. O Sr. Tristão, assim era o seu nome,  era olhado com grande suspeita e curiosidade por todos os meninos da rua. Cada vez que ele passava, sempre olhando o chão, os rapazes paravam de jogar à bola e faziam silêncio. O chapéu cinzento triste e as mãos grandes e ásperas chamavam a atenção:
- Tem sempre a cara tapada com aquele chapéu. Nunca lhe consigo ver os olhos...
- E as mãos? Já viste as mãos? O que faz ele para ter as mãos sempre com pensos rápidos?
- Coisa boa não é...
Quando davam por isso, já o Sr, Tristão tinha desaparecido a passos largos e dobrado a esquina para parte incerta.
Foi numa tarde tristonha de Inverno, quando a bola foi parar para lá do portão de grades ferrugentas, que o  Jaime  descobriu o mistério. Quando procurava pela bola, uma porta entreaberta atraiu-o e eis que viu o vulto do Sr. Tristão. Hesitou em fugir mas a curiosidade foi mais forte. O coração do Jaime palpitava cada vez mais forte, tum-tum, tum-tum, mas ao espreitar pela porta sentiu uma grande desilusão. 
Óooo... Eu que achava que ele era um bandido perigoso e afinal arranja candeeiros...



Friday, January 18, 2013

ERA UMA VEZ... O Corvo Pensador


Era uma vez um pássaro que era um Corvo-Marinho. Ora normalmente o corvo-marinho gosta muito de mergulhar na água, lá do alto de forma a avistar bem os peixes que quer pescar. Mas o corvo desta história passava os dias a pensar no cimo de uma grua à beira-mar e não queria nem pensar em mergulhos. Pensava na sorte dos pescadores que não tinham de mergulhar para encontrar o almoço, pensava para onde iria todo aquele peixe transportado nas traineiras e pensava na sorte dos gatos a quem sempre se atirava uma sardinha ou duas ali perto, no porto. Os seus irmãos, pelo contrário, divertiam-se a mergulhar, engordavam a pescar e recolhiam ao ninho muito bem-dispostos. A dada altura,  o pai do Corvo-Marinho começou a ficar preocupado pois via o seu filho mais novo cada vez mais magro e pensador:
-Meu filho, tens de pensar menos e mergulhar mais. Como é que te vais alimentar?
Num dia de muita fome e de muito pensar, o corvo-marinho lembrou-se do Gato Mateus e das varinas da Madragoa. Quando o gato se enrolava nas pernas delas, havia sempre uma que caía juntamente com a cesta do peixe. Essa era a altura ideal para apanhar o peixe do dia, e sem ter de mergulhar! E foi assim que o Corvo-Marinho, que deixou de ser marinho, nunca mais pôs as patas no mar e começou a engordar.

Tuesday, January 8, 2013

ERA UMA VEZ... O Beijo



Era uma vez um menino muito bonito mas muito envergonhado. Esse menino, que se chamava Manuel, andava sempre sózinho no recreio da escola e ninguém percebia porquê. Todas as raparigas tentavam meter conversa com ele mas o Manuel conseguia sempre escapar. Era grande motivo de conversa das meninas nos intervalos das aulas. A Marta ficava sempre muito vermelha quando se falava dele pois, secretamente, estava perdidamente apaixonada pelo Manuel.

Um dia quando passeava à beira rio, o Manuel foi ter com ela.
- Queres ser minha amiga? Perguntou o Manuel.
A Marta sem acreditar no que ouvia, disse a medo que sim. Mas quando o Manuel lhe foi dar um beijinho, a Marta não faz mais nada e tira do bolso o seu telemóvel. Ouve-se um clic e tira uma fotografia.
- Se eu contar às minhas amigas que tu agora és meu amigo elas nunca vão acreditar...